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Notícias - Artigo da Semana

Trabalho de Parto nos Dias Atuais

Postado em 07 de junho de 2018

Indução do trabalho de parto em gestantes de baixo risco: “39 é o novo 41”?

A indução do trabalho de parto é realizada quando há risco materno e fetal na espera do trabalho de parto natural. É uma intervenção obstétrica comum que precede 20% de todos os nascimentos. Em gestações de alto risco, os trabalhos recentes mostram que o parto deve ser realizado entre 37 e 38 semanas. Nas gestações de baixo risco, a idade gestacional adequada ainda não é bem estabelecida.

As recomendações do ACOG (Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia) de 2004, referentes ao manejo de gestações pós-termo, referem que gravidezes que persistem além de 42 semanas estão associadas a oligoamnio, lesão no parto, macrossomia, síndrome da aspiração meconial e natimorto.

Embora no passado acreditava-se que a indução do trabalho de parto com 41 semanas e a adoção de conduta expectante eram ambas práticas aceitáveis. Hoje observa-se que a indução com 41 semanas independente da paridade é vantajosa.

Em 2012, uma revisão sistemática sobre indução do trabalho de parto para melhorar desfechos do nascimento em gestantes com gestação a termo ou pós-termo, concluíram que comparado à conduta expectante, a indução do trabalho de parto com 41 semanas apresenta uma redução estatisticamente significativa em todas as causas de mortalidade perinatal (RR 0,31, IC95% 0,12 – 0,88) com diminuição simultânea nas taxa de parto cesariana (RR 0,89, IC95% 0,81-0,97). A cada 410 pacientes tratadas com indução em 41 semanas, evitou-se morte perinatal (IC95% de 322-1492). A indução do trabalho de parto com 41 semanas é atualmente a estratégia mais praticada nos Estados Unidos e Canadá. Nesta revisão, nós resumimos as evidências mais recentes que mostram que a indução do trabalho de parto em gestações de baixo risco a termo devem ser realizadas antes de 41 semanas e porque consideramos que “39 é o novo 41”.

Implicações fetais e neonatais da gestação prolongada além de 39 semanas:

Entre 1:50 e 1:500 fetos sofrem uma catástrofe de eventos neurológicos permanentes ou até morte.


Morbidade X Idade Gestacional:


Morbidades perinatais precoces, como síndrome da angústia respiratória aguda, sepse, hemorragia intraventricular e enterocolite necrotizante diminuem à medida que a idade gestacional se aproxima de 37–38 semanas, e a partir disso mantem-se estáveis. O mesmo ocorre com doenças neurológias de longo prazo, como convulsões, atraso no desenvolvimento neuropsicomotor e paralisia cerebral. Já a probabilidade de desenvolvimento de encefalopatia do recém-nascido aumenta nitidamente quando a idade gestacional é prolongada para além de 39 semanas, e esse valor dobra o risco com até 42 semanas. A morbidade de longo prazo, como por exemplo da retinopatia da prematuridade e displasia broncopulmonar é muito maior em torno de 32 semanas de gestação. Admissões em UTI neonatais atingem o valor máximo até a 35ª semana.

Um estudo de coorte retrospectivo da California analisou as taxas de complicações neonatais a termo e mostrou que a incidência de mecônio e macrossomia fetal aumentam com o avançar da idade gestacional. Além disso, complicações neonatais severas como: lesão do plexo braquial, convulsões neonatais, hemorragia intraventricular, fratura craniana, sepse neonatal, síndrome da aspiração meconial e síndrome do desconforto respiratório agudo apresentam redução na frequência de 3,6% com 37 semanas para 1,8% com 39 semanas e após este período aumenta em 2,3% com 40 semanas e 4,6% com 43 semanas de gestação.

Mortalidade:

Natimortos são responsáveis por mais morte perinatal do que prematuridade, malformações congênitas, doenças cromossômicas e síndrome da morte súbita infantil juntas. A maior parte das causas para natimortos são inexplicáveis. As taxas de morte inexplicável aumentam nitidamente de 0,49/1000 em gestações de 39 semanas para 1,27/1000 em gestações de 41 semanas. Afirma-se de formas diferentes que o risco de natimorto é de 1/2039 com 39 semanas, 1/1148 com 40 semanas, 1/786 com 41 semanas e 1/486 com 43 semanas.

Índice de risco perinatal é a probabilidade cumulativa de morte perinatal (natimortos e mortes neonatais com até 4 semanas de nascimento) em uma dada a idade gestacional multiplicada por 1000. Um estudo populacional realizado na Escócia mostrou que o índice de risco perinatal tem as menores taxas com 38 semanas (menos que 2/1000 nascimentos), aumentando significativamente para aproximadamente 6,0 e 4,5/1000 nascimentos com 42 semanas em pacientes nulíparas e multíparas respectivamente.

Mortalidade infantil corresponde às mortes ocorridas antes do primeiro ano de vida e aumenta com o avançar da idade gestacional de 1/1000 com 39 semanas para 6/1000 com 43 semanas.

É possível prevenir ou prever a mortalidade perinatal?

Apesar de inúmeros testes clínicos, bioquímicos e radiológicos e algoritmos preditivos, ainda não é possível predizer com acurácia a causa de natimortos. Vale mencionar que a politica de parto cesariana eletivo com 39 semanas conseguiria prevenir 2 natimortos em 1000 gestações ou 6000 vidas salvas no EUA anualmente, que excede em muito a eficácia de qualquer outra estratégia preventiva proposta até o momento. Rotineiramente a indução do trabalho de parto com 39 semanas tem o potencial de ser igualmente benéfico.

Data ideal para o parto em gravidez de baixo risco:
Pela perspectiva fetal a maioria dos dados mostra benefícios no parto antes de 40 semanas, a única questão é se esta data deve ser de 37 para 38 semanas ou 39 semanas. Enquanto o parto com 37 para 38 semanas parece estar associado ao baixo risco de mortalidade perinatal, pode ocorrer aumento no risco de síndrome do desconforto respiratório agudo, uso de UTI neonatal, ventilação mecânica e hipoglicemia. Partos com 39 semanas poderiam aumentar a mortalidade perinatal de 0,7/1000 com 37 semanas para 1,4/1000 com 39 semanas, mas simultaneamente reduziria em 6 vezes a chance de outros eventos adversos.

Complicações maternas em prolongar a gestação para além de 39 semanas:

Uma grande preocupação em relação à indução do trabalho de parto é que pode ocorrer aumento das taxas de parto cesarianas e complicações relacionadas ao procedimento. Os primeiros estudos que sugeriram essa associação eram em sua maioria observacionais e sujeitos a vieses de seleção e erros metodológicos. As evidências mais recentes demostram que esta associação não é verdadeira. Em uma revisão sistemática realizada em 2012 comparando indução do trabalho de parto versus conduta expectante em mulheres com gestação a termo ou pós-termo incluiu 22 ensaios clínicos randomizados e 9383 mulheres, a mortalidade perinatal foi 1/3730 para o grupo com indução do trabalho de parto e 13/3677 para o grupo de conduta expectante (RR 0,31; IC 95% 0,12 – 0,88) claramente a favor do grupo de indução do trabalho de parto. Embora a taxa de partos vaginais fosse maior em consequência da indução do trabalho de parto (RR 1,1 IC 95% 1,0 – 0,88) a taxas de parto cesariana foram significantemente menores (RR 0,89 IC 95% 0,81 – 0,97).

Uma revisão sistemática que recente incluiu 157 estudos comparando indução do trabalho de parto com conduta expectante sugeriu que a indução do trabalho de parto reduz as taxas de parto cesariana em 12%, as taxas de morte fetal em 50%, admissões em UTI neonatal em 14 % e não ouve aumento na taxa de mortalidade materna. Esse efeito foi significante em gestações de termo (RR 0,87 IC 95% 0,82 -0,92), pós-termo (RR 0,82 IC 95% 0,69 – 0,99) e não em prematuros (RR 1,0 IC 95% 0,88 – 1,14).

Surpreendentemente, a taxa de parto cesariana diminuiu mesmo quando a indução do trabalho de parto foi realizada sem indicação médica (RR 0,81, IC 95% 0,7 – 0,93), quando o colo uterino foi desfavorável (RR 0,87 IC 95% 0,81 – 0,94) , em gestações de alto risco (RR 0,89 IC 95% 0,84 – 0,94), e gestações de baixo risco (RR 0,89 IC 95% 0,75 – 0,94).

Esses achados são consistentes com os dados da Agencia de Pesquisa e Qualidade em Saúde do Departamento de Serviços Humanos e Saúde dos Estados Unidos de 2009, que concluíram que a indução do trabalho de parto estava associada com uma menor duração do trabalho de parto e menores de taxas de parto cesariana, sem diferença nas taxas de infecção materna, laceração perineal, hemorragia pós-parto ou necessidade de transfusão sanguínea. Além disso, grandes estudos populacionais de gestação de baixo risco sugerem que além do aumento do risco do parto cesariana, o aumento sucessivo de cada semana gestacional após 39 semanas está associado com o aumento de outras complicações maternas como morbidades febris, maior risco de laceração perineal e hemorragia pós-parto. Os estudos clínicos e revisões sistemáticas mostram que mulheres nulíparas e gestante com cervix desfavorável são mais beneficiadas com a indução do trabalho de parto do que conduta expectante, independente da indicação para indução do trabalho de parto.

Preocupações adicionais: Outras preocupações levantadas sobre a indicação de rotina da indução do trabalho de parto em uma idade gestacional mais precoce são relativamente pequenas. Prematuridade iatrogênica, antigamente um problema sério, desapareceu com a melhor acurácia da idade gestacional pelo USG realizado precocemente. Preocupações sobre a medicalização de um processo fisiológico, questão amplamente debatida, atualmente, podem ser facilmente respondidas analisando as melhoras dos desfechos perinatais e maternos. Embora, dados precisos sobre o custo-benefício de indução de rotina versus conduta expectante com 39 semanas sejam escassos, as análises de custo comparativas tem mostrado uma economia significativa no grupo de indução do trabalho de parto. De maneira análoga, a satisfação das pacientes tem sido maior com indução do trabalho de parto em relação a conduta expectante, quando analisadas situações clínicas similares.

Conclusões: Se uma gestante saudável pergunta a você qual a melhor idade gestacional para o nascimento de seu bebê, a resposta é: 39 semanas! A gravidez que vai além de 39 semanas está associada com um aumento pequeno porém consistente do risco de natimorto, assim como outros eventos adversos: síndrome do desconforto respiratório aguda, admissões em UTI neonatal, uso de ventilação mecânica e hipoglicemia. Além disso, com o advento de novas medicações para o amadurecimento cervical, os riscos são mínimos. Então porque a relutância em mudar a prática? Existe algum grande estudo clínico randomizado necessário para estabelecer o benefício além de uma dúvida razoável? Nós realmente precisamos de mais estudos que analisem as preferências das pacientes? Não há muito que o cuidado obstétrico possa fazer sobre os eventos adversos que ocorrem no início da gestação, como falha de implantação, abortamento de repetição, incompetência istmo-cervical, prematuridade. Porém, é possível minimizar comorbidades e perdas gestacionais tardias. 39 semanas e parto, salvo pelo nascimento!!!

Artigo revisado por Dra. Nathália Frare

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